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Não estacionar no bem nem progredir no mal

    A vida espiritual é movimento.
    Quem acredita que já faz o suficiente no bem, sem buscar se aprimorar, começa a estagnar — e, no caminho da alma, estagnação é retrocesso.
    A frase “Não estacionar no bem nem progredir no mal” é um chamado à vigilância interior, à consciência de que o crescimento moral não termina enquanto estivermos respirando.

    Muitas vezes, o mal não se manifesta apenas em grandes faltas, mas em pequenas concessões — em gestos de orgulho, indiferença, egoísmo ou crítica. E, quando repetidos, esses gestos criam um tipo de progresso às avessas: o progresso no erro.
    Por outro lado, o bem que não se renova torna-se conforto, e o conforto, com o tempo, se transforma em indiferença.

    O convite do Evangelho é para que avancemos na luz, não para que nos contentemos com o pouco que já fazemos de correto.
    Crescer espiritualmente é um trabalho contínuo de autoconhecimento, humildade e coragem. É manter o coração em movimento — sem estacionar nas virtudes conquistadas, mas também sem fortalecer as sombras que ainda nos habitam.

    Nas reflexões a seguir, cada voz mostra como esse desafio se manifesta nas diferentes fases da vida, nas relações humanas e nos dilemas cotidianos.

    Perspectiva do homem maduro

    Quando eu era mais jovem, pensava que ser uma boa pessoa bastava.
    Acreditava que, por não fazer mal a ninguém, já estava em paz com Deus.
    Mas a maturidade me ensinou que não se trata apenas de evitar o mal, mas de crescer no bem, de fazer algo útil com o tempo e as oportunidades que a vida oferece.

    Depois do divórcio e da saída dos meus filhos de casa, vivi um período de introspecção.
    Achei que a solidão era um castigo, mas hoje vejo que foi um convite à transformação.
    Foi nesse silêncio que percebi o quanto a fé precisa de movimento — e que o bem acomodado é uma forma sutil de egoísmo.

    Lembro-me de um versículo que me marcou profundamente: “A quem muito foi dado, muito será exigido.” (Lucas 12:48).
    Percebi que não basta ser honesto e correto — é preciso colocar a vida a serviço, ser instrumento de algo maior.
    Não adianta estacionar na zona de conforto espiritual enquanto tantos ainda esperam por uma palavra, um gesto ou um exemplo.

    Hoje, busco exercer o bem de forma ativa: ouvindo, ajudando, orientando os mais jovens.
    Não para ser reconhecido, mas para que o amor que recebo de Deus encontre caminho através de mim.
    O verdadeiro progresso espiritual está em não estacionar no bem, mas expandi-lo, multiplicá-lo e deixá-lo fluir.

    Perspectiva da mulher sobrecarregada

    Durante muito tempo, acreditei que ser “do bem” era o suficiente.
    Eu me considerava uma pessoa justa, trabalhadora, dedicada à família — e achava que isso bastava.
    Mas comecei a perceber que, mesmo fazendo o bem, eu o fazia cansada, impaciente, às vezes com ressentimento.
    E entendi: não basta praticar o bem, é preciso evoluir na intenção.

    “Não estacionar no bem nem progredir no mal” me lembra diariamente que o coração precisa se renovar.
    De que adianta fazer o certo se a alma está amarga?
    De que adianta ajudar, se no fundo se espera reconhecimento?
    Esses pensamentos me confrontam, e foi a partir deles que comecei a compreender o que é crescer espiritualmente no meio da rotina.

    Hoje, tento transformar o que antes era obrigação em escolha consciente.
    Procuro realizar as mesmas tarefas — cuidar dos filhos, do lar, do trabalho — mas com outro espírito: o da entrega e da gratidão.
    Descobri que o bem não é apenas o que fazemos para os outros, mas o que permitimos que floresça dentro de nós.

    Quando me percebo impaciente ou injusta, lembro-me de que o mal também cresce em silêncio.
    E que, se eu não me vigiar, acabo progredindo no egoísmo — mesmo disfarçado de bondade.
    Por isso, todos os dias busco um passo a mais: ouvir melhor, reclamar menos, agradecer mais.
    Não é fácil, mas é isso que mantém a alma viva e em movimento.

    Perspectiva da mulher madura

    A velhice é tempo de colheita, mas também de revisão.
    Muitas vezes, olho para trás e penso em tudo o que fiz pelos outros — pelos filhos, pelos netos, pela comunidade — e me pergunto: ainda estou crescendo ou apenas repetindo o que sempre fiz?
    Essa pergunta me confronta, porque percebo o quanto é fácil estacionar nas virtudes antigas e achar que já é suficiente.

    A verdade é que o amor também precisa ser atualizado.
    O mundo muda, as pessoas mudam, e a forma de expressar o bem também precisa mudar.
    Já percebi que, se não me abro para compreender as novas gerações, acabo fechando o coração — e o bem que não se renova se transforma em crítica, em rigidez, em distância.

    A Bíblia me lembra: “Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente.” (Romanos 12:2).
    Essa passagem me inspira, porque mostra que o progresso espiritual não tem idade.
    Deus não espera que eu faça o mesmo que fazia aos 30, mas que mantenha o desejo de aprender, perdoar e entender o outro, mesmo com as diferenças.

    Hoje, percebo que não posso permitir que o cansaço da vida me faça parar de evoluir.
    Ainda há muito o que lapidar — na paciência, na humildade, na aceitação.
    E se o corpo desacelera, que a alma continue andando.
    Não estacionar no bem é deixar que o amor encontre novas formas de florescer, mesmo em terrenos antigos.

    Perspectiva de jovem profissional em busca de realização

    Trabalho em um hospital, e todo dia vejo como a vida é frágil e passageira.
    Pessoas boas, com boas intenções, partem cedo; outras, que viveram com dureza, encontram um segundo tempo para mudar.
    Essas experiências me fazem refletir sobre o movimento constante da alma e como é fácil perder-se entre o bem e o mal — não por maldade, mas por distração.

    No começo da carreira, eu acreditava que bastava fazer o que é certo.
    Hoje percebo que a vida espiritual é mais exigente: não basta não errar — é preciso fazer o certo com propósito.
    Em um ambiente onde a dor e o medo são diários, aprendi que o bem precisa ser ativo, sensível e persistente.

    Há momentos em que sinto raiva, impotência, cansaço. E é nessas horas que entendo a segunda parte da frase — “nem progredir no mal.”
    O mal às vezes se manifesta quando perdemos a esperança, quando deixamos de acreditar no que fazemos.
    E é por isso que, a cada plantão, peço a Deus que me mantenha desperta, vigilante e humilde.

    Crescer no bem é não deixar o coração endurecer.
    É continuar acreditando na cura, mesmo quando ela não vem.
    É seguir ajudando, mesmo quando ninguém agradece.
    Porque o verdadeiro progresso espiritual não está nos grandes feitos, mas na constância silenciosa de quem não desiste de amar.

    O Caminho em Movimento

    “Não estacionar no bem nem progredir no mal” é mais do que um conselho moral — é uma lei da alma.
    Assim como o corpo adoece quando para, o espírito enfraquece quando deixa de evoluir.
    E quando, por distração, alimenta pequenas sombras, o mal também cresce — sutil, silencioso, mas firme.

    O homem maduro aprendeu que o bem precisa de ação.
    A mulher sobrecarregada entendeu que ele também precisa de pureza de intenção.
    A mulher idosa descobriu que o amor envelhece bem apenas quando se renova.
    E o jovem profissional percebeu que até no cansaço é possível servir com fé.

    O progresso espiritual é um fluxo — não há chegada, apenas avanço.
    E é nessa busca diária, feita de quedas, esforços e renascimentos, que a alma encontra seu verdadeiro destino:
    o de caminhar sempre em direção à luz, sem parar no bem e sem jamais progredir no mal.

    * O tema “Não estacionar no bem nem progredir no mal” é utilizado como estudo na Escola de Aprendizes do Evangelho (AEA), a fim de oferecer um guia para nossa reforma íntima.